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03/09/2024     nenhum comentário

PREFEITURA DE PORTO ALEGRE PAGA R$ 8,4 MILHÕES PARA CONTRATAR TERCEIRIZADOS QUE DENUNCIAM NÃO TER O QUE FAZER

A situação de calamidade provocada pela enchente de maio permitiu contratar o centro Calábria com dispensa de licitação, mas há fortes indícios que contratação sirva de fachada para fins escusos

No mínimo duvidosa a terceirização de serviços para assistir desabrigados na capital gaúcha. Uma reportagem do site Sul 21 explica em detalhes mais um caso de dinheiro público sendo escoado pelo ralo da incompetência, para não dizer da corrupção.

Confira abaixo a reportagem, na íntegra.

Em 3 de junho de 2024, a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) firmou um termo de colaboração com a organização da sociedade civil (OSC) Centro de Educação Profissional São João Calábria, vinculada à instituição religiosa Instituto Pobres Servos da Divina Providência, para a contratação, de forma terceirizada, de 128 profissionais, entre psicólogos e assistentes sociais, para atuarem em abrigos temporários, nos Cras (Centros de Referência de Assistência Social) e nos Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) de Porto Alegre.

Assistentes sociais contratadas para prestar o serviço pela Calábria denunciaram ao Sul21 não haver trabalho nos abrigos que justifique o número de pessoas contratadas e os valores de investimento previstos.A apuração identificou ainda que não foram prestados serviços no âmbito do contrato relativos aos Cras e Creas.

Válido por 180 dias, o contrato prevê o pagamento de até R$ 8.486.107,14, tendo sido assinado por meio de dispensa de licitação em razão do decreto de calamidade pública da Prefeitura de Porto Alegre. No entanto, conforme relataram ao Sul21 em condição de anonimato três assistentes sociais que foram contratadas pela Calábria no âmbito da parceria, os profissionais terceirizados têm baixíssima demanda de trabalho, passando o dia em home office ou na sede da instituição, no bairro Nonoai, sem executarem as atividades previstas de assistência social junto à população desabrigada. Além disso, grande parte dos trabalhadores contratados já teriam sido demitidos pela OSC nas primeiras semanas após suas contratações.

Conforme consta no contrato disponibilizado no Portal da Transparência da Prefeitura, o Termo de Colaboração 265, firmado entre Fasc e Calábria, prevê o pagamento de R$ 227.273,26 a título de verba de implantação e R$ 8.258.833,88 divididos em seis parcelas mensais, sendo a primeira no valor de R$ 1.443.138,98 e as próximas cinco de R$ 1.363.138,98 na conta do Instituto Pobres Servos da Divina Providência. Na aba “gastos por favorecido” do Portal da Transparência, é possível verificar que o pagamento da verba de implantação foi autorizado em 4 de junho, tendo sido já quitado. O portal também indica que a Prefeitura já autorizou outros dois empenhos para a Rede Calábria no âmbito do termo de colaboração, nos valores de R$ 1,27 milhão, em 5 de julho, e R$ 6,8 milhões, em 24 de julho. Quanto ao primeiro empenho, todo o valor já foi liquidado, enquanto R$ 1,3 milhão foram pagos com relação ao segundo empenho, totalizando R$ 2,8 milhões já efetivamente pagos.

Os termos do contrato não condicionam o pagamento do valor integral ao número de profissionais contratados pela Calábria, tampouco indica métricas de atuação, mas preveem a restituição dos saldos financeiros em caso de não utilização e estabelece que a OSC deve utilizar os recurso conforme Planos de Trabalho aprovados pela Fasc. O termo de colaboração foi firmado antes da Fasc apresentar ao Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS), que também questiona essa contratação, o projeto para o Serviço de Proteção em Situações de Calamidades Públicas e de Emergências, o que é preconizado pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas).

As trabalhadoras ouvidas pelo Sul21 relatam que, quando foram contratadas, Porto Alegre ainda contava com dezenas de abrigos para atingidos pela enchente de maio em funcionamento. Naquele momento, a orientação passada pela chefia era para que atuassem no cadastramento dos atingidos para recebimento de benefícios sociais e na desmobilização dos abrigos. Elas contam que, logo de cara, perceberam que havia uma sobreposição de funções com trabalhadores terceirizados de outras OSCs que atuavam nos mesmos espaços, a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (Adra) e a Associação Vivendo Atos 29, que também firmaram termos de colaboração com a Prefeitura de Porto Alegre após a enchente, por meio de dispensa de licitação, para atuar em serviços de atendimento aos desabrigados.

O que se viu logo de cara, segundo elas, foi que havia mais profissionais do que demanda de trabalho, que foi reduzida em razão da desmobilização de diversos abrigos e resultou uma quantidade maior de profissionais do que a necessária para atender indivíduos e famílias que permaneciam nas instalações provisórias.

Juliana* iniciou o contrato com a Calábria em meados de junho, como parte da turma de 20 assistentes sociais chamadas para o serviço. Andressa* foi contratada no final do mesmo mês. Ela conta que, quando a sua turma de 20 pessoas deu início ao trabalho, já havia outras 50 assistentes sociais que não estavam “fazendo nada” na sede da Calábria ou em home office, uma vez que já não havia mais demanda nos abrigos. “Não tinha o que fazer. Não tinha nem cadeira para sentar na sede da Calábria”, diz Andressa.

O Sul21 teve acesso a uma tabela enviada aos profissionais contratados pela Calábria no âmbito do termo de colaboração em 2 de agosto. No documento são informados dias em que os assistentes sociais não trabalhariam naquela semana, além de especificar que 20 estavam atuando, naquele momento, em home office para capacitação.

Dez dias após assinar o contrato, Andressa, que receberia R$ 4.213,50 mensais, foi comunicada que o acordo trabalhista que previa experiência de 60 dias, com possibilidade de prorrogação, seria rescindido um mês após o início. Juliana, que também teve o contrato rescindido poucas semanas após ser admitida, afirma que as demissões começaram a ocorrer depois que a maioria dos abrigos tinha sido desmobilizada.

Apesar do contrato entre Fasc e Calábria prever a contratação de 128 profissionais, as trabalhadoras dizem que o máximo de contratações foi de 97, sendo 82 assistentes sociais e 15 psicólogos. Nesta segunda-feira, cerca de três meses após o início da vigência do termo de colaboração com a Calábria, 54 profissionais ainda estariam atuando no âmbito do contrato.

Quando fechou o primeiro mês, quando eles contrataram a última turma de assistentes sociais, já tinha mais de 50 sem ter o que fazer. Eu fiquei pensando: ‘por que contrataram mais se nós não temos o que fazer?’”, diz Juliana.

Ela acrescenta ainda que, em sua entrevista com representantes da Calábria, recebeu a garantia de que a contratação seria para os seis meses previstos no termo de colaboração. “O padre olhou nos meus olhos e garantiu seis meses. Mas essa questão eu nem discuto, porque eles têm direito de contratar e desligar. Mas, sim, esse movimento de contratar sabendo que já não tinha o que fazer, continuar contratando e completar um mês de trabalho e começar a demissão em massa”.

Samantha* rompeu recentemente o vínculo com a Calábria, mas mantém contato com as profissionais que ainda estão atuando. Ela afirma que as colegas que permanecem trabalhando no âmbito do contrato não possuem demanda de atividades rotineira. Ela destaca que o Abrigo Esperança, na Restinga, que acolhe apenas quatro desabrigados, diante de uma capacidade contratada de 50 pessoas, conta com dois assistentes sociais, número que seria desnecessário. Quando visitou o local, o Sul21 conversou com profissionais contratados pela Calábria e pela Atos 29 que atuavam no espaço.

Um dos exemplos que elas trazem de falta de demanda de trabalho é referente às três equipes, cada uma formada por quatro assistentes sociais e um psicólogo, criadas para realizar a busca ativa de atingidos pela enchente, o que seria um serviço inviabilizado, segundo as profissionais, porque o controle das informações relativas aos abrigados era frágil, não sendo possível ter certeza sobre os dados das famílias e o período que permaneceram em cada alojamento.

As assistentes sociais apontam que não há transparência por parte da Calábria sobre as atividades que devem ser desempenhadas. “A verba é altíssima, mas não está sendo direcionada para absolutamente nada. Para onde está? Cadê a transparência desses valores”, diz Samantha. “São profissionais fantasmas, isso que dá a impressão”, acrescenta. “A maioria das colegas tem certeza que é lavagem de dinheiro”, complementa Andressa.

Além da falta de demanda de trabalho, as assistentes sociais ouvidas pela reportagem lamentam o fato de que, na verdade, há muito trabalho de assistência social a ser feito com relação aos atingidos pelas enchentes em Porto Alegre, mas que as profissionais não têm autonomia para realizar esse serviço. Elas afirmam que eram orientadas pela chefia a passarem o mínimo necessário de informações para os abrigados, restrito à questão dos benefícios, e de que não deveriam se comunicar com profissionais da Fasc. Elas ponderam que o papel do assistente social é trabalhar intervindo junto aos assistidos, mas essa atuação era limitada pela chefia. Para contornar essas orientações, dizem que muitas informações eram passadas e trocadas ‘em off’, sem que a chefia soubesse.

“O nosso trabalho é totalmente limitado. O trabalho de assistente social é interventivo. A gente trabalha com o concreto, de fato. E isso nos foi tirado. A gente não tinha autonomia, nem liberdade de atuação em nenhum momento. Qualquer ação que a gente pensava em prol da dignidade da pessoa era vetada”, diz Samantha.

Andressa pontua que, ao ser contratada, buscou informações sobre a atuação de assistentes sociais em outras experiências de calamidade, como após a tragédia de Brumadinho (MG), mas pontua que nada do que era preconizado nessas situações foi passado como orientação em Porto Alegre. Ela diz que o treinamento que receberam durou um dia e se tratou basicamente de uma apresentação na Rede Calábria, pela manhã, e da Fasc, pela tarde. “Nada mais do que isso”.

De acordo com os dados atualizados na tarde desta segunda-feira (2) no painel de Monitoramento de Abrigos Eventos Adversos 2024 do governo do Estado, Porto Alegre tem 473 pessoas desabrigadas acolhidas em 9 instituições, sendo 327 delas no Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Vida, no Rubem Berta, gerido pelo governo do Estado e pela Agência da Organização das Nações Unidas (ONU) para as Migrações (OIM). As demais 146 estão divididas em oito alojamentos provisórios, o que inclui os abrigos geridos pela Fasc e que devem ser atendidos pela Calábria, mas também ao menos outros três que estão sendo mantidos de forma voluntária sem ligação com a Prefeitura. A Fasc não retornou questionamentos da reportagem que incluíam quantos abrigos estavam sendo geridos pela Calábria e quantas pessoas estavam acolhidas nestes locais.

Por outro lado, o Sul21 obteve a informação de que mais um alojamento vinculado à Fasc está em processo final de desmobilização, o Abrigo do Centro Assistencial Paz (Capaz). As trabalhadores expressam preocupação com o contexto em que ocorrem essas desmobilizações, uma vez que grande parte das pessoas que permanecem nos alojamentos da Prefeitura ou estão em situação de rua ou não são aceitas no Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Vida, no Rubem Berta. Neste caso, acabam tendo que voltar para situações precárias de moradia ou para a rua.

Mais contratos com a Fasc
Em 21 de agosto, o Sul21 publicou uma reportagem apontando que a Prefeitura de Porto Alegre firmou, em julho deste ano, três contratos com Organizações da Sociedade Civil, com valores que, somados, poderiam chegar a quase R$ 4,2 milhões, para a instalação de até 10 abrigos voltados para o acolhimento de desabrigados da enchente de maio na Capital. A expectativa era de que fossem acolhidas 50 pessoas por abrigo, totalizando 500 vagas. Contudo, em visita a dois dos abrigos instalados no âmbito do contrato, a reportagem do Sul21 constatou que eles operavam com um número baixíssimo de desabrigados da enchente, inferior a 10 pessoas nos dois espaços.

O principal desses termos de colaboração foi firmado com a Associação Vivendo Atos 29 para a instalação de até sete alojamentos em caráter excepcional para famílias e indivíduos atingidos pela emergência ou calamidade. O contrato, com previsão de vigência de três meses a partir da assinatura — podendo ser prorrogado mediante aditivo por solicitação da organização beneficiada –, tem valor previsto de até R$ 2.918.465,20.

Conforme o contrato, as verbas seriam repassadas em quatro vezes. A primeira, a título de verba de implantação, corresponde à previsão e repasses de R$ 59.500 por alojamento, até um máximo de R$ 416.500 com a instalação dos sete alojamentos. A partir daí, prevê o pagamento de três parcelas de R$ 119.141,20 por alojamento, totalizando R$ 833.988,40 em caso de implantação dos sete alojamentos.

De acordo com o Portal da Transparência, a Prefeitura autorizou quatro repasses à Associação Vivendo Atos 29 desde o início de maio, nos valores de R$ 27 mil e R$ 3,97 milhões no dia 21 de maio, R$ 416 mil em 23 de julho e R$ 222 mil em 25 de julho, estes dois últimos totalmente liquidados. O maior dos repasses de 21 de maio, dos quais R$ 1,3 milhão já foram pagos, teve como destino o serviço de atendimento imediato para atingidos pela enchente. Já os repasses feitos em maio são referentes, respectivamente, à parcela de implantação e à parcela de julho do termo de colaboração 340 firmado com a Atos 29.

Chama a atenção o fato de que o valor pago a título de verba de implantação corresponda ao máximo previsto no contrato, isto é, equivalente à instalação de sete abrigos, enquanto o primeiro repasse mensal corresponda a pouco menos do que o valor referente a dois abrigos. A Fasc não informa quantos alojamentos teriam sido instalados no âmbito do contrato.

Após a publicação da primeira matéria, assistentes sociais contratadas pela Rede Calábria procuraram a reportagem com o objetivo de denunciar a situação relativa aos serviços previstos no termo de colaboração 265.

O Portal da Transparência indica ainda que a Prefeitura autorizou, em 11 de junho, o empenho de R$ 7,1 milhões no âmbito do termo de colaboração 01 firmado com para a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistência, a Adra, para o atendimento de atingidos por eventos climáticos, dos quais R$ 1,557 milhão já foi liquidado. O portal também indica que, em 6 de junho, foi autorizado o empenho de outros R$ 2,1 milhões no âmbito do mesmo termo com a Adra, mas não há informações sobre valores já liquidados.

A reportagem do Sul21 enviou uma série de perguntas para a Rede Calábria a respeito da execução do contrato, como o número de profissionais que tinham sido contratadas e quantas estavam em atuação no momento. Diretora-geral da instituição, Marinês Zanella retornou que as respostas poderiam ser dadas pela Fasc e disse que “toda a parceria celebrada para execução de serviços, tem fiscais do poder público que acompanham a execução e realizam o monitoramento”.

A reportagem já havia questionado a Fasc sobre o monitoramento dos profissionais contratados pela Calábria, o número de abrigos atendidos pela instituição, os problemas apontados pelas trabalhadoras, como era feita a comprovação do uso dos recursos repassados e as diferenças entre as atuações das diversas OSCs em um mesmo ambiente. A Fasc não respondeu nenhum questionamento até a publicação da matéria.

*Os nomes foram alterados para preservar a identidade das fontes

CONTRA TODAS AS FORMAS DE TERCEIRIZAÇÃO E PRIVATIZAÇÃO!

Como se vê, terceirizar os serviços é fragilizar as políticas públicas, colocar a população em risco e desperdiçar recursos valiosos com ineficiência, má administração ou até má fé de entidades privadas.

Disfarçadas sob uma expressão que esconde sua verdadeira natureza, as organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil (OSCs) e oscips e não passam de empresas privadas, que substituem a administração pública e a contratação de profissionais pelo Estado. Várias possuem histórico de investigações e processos envolvendo fraudes, desvios e outros tipos de crimes.No setor da saúde, essas “entidades”, quando não são instrumentos para corrupção com dinheiro público, servem como puro mecanismo para a terceirização dos serviços, o que resulta invariavelmente na redução dos salários e de direitos.

Embora seja mais visível na Saúde, isso ocorre em todas as áreas da administração pública, como Educação, Cultura e Assistência Social. O saldo para a sociedade é a má qualidade do atendimento, o desmonte do SUS, das demais políticas públicas e, pior ainda: o risco às vidas.

Todos estes anos de subfinanciamento do SUS e demais serviços essenciais, de desmantelamento dos direitos sociais, de aumento da exploração, acirramento da crise social, econômica e sanitária são reflexos de um modo de produção que visa apenas obter lucros e rentabilidade para os capitais. Mercantiliza, precariza e descarta a vida humana, sobretudo dos trabalhadores. O modelo de gestão por meio das Organizações Sociais e entidades afins é uma importante peça desta lógica nefasta e por isso deve ser combatido.

Não à Terceirização e Privatização dos serviços públicos!

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